Publicado em 15/11/2012 por Barros
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Em
algum lugar escondido das terríveis páginas do Antigo Testamento, há um
versículo em que a divindade hebraica instrui seus crentes a matar a
pedradas os que ousarem querer desviar seu povo para adorar outro deus.
Suponho que deva haver ordem semelhante para os que não adoram deus
algum, pois durante um longo período da nossa História pessoas foram
executadas pelo crime de não crer em Deus.
Foi pensando nisso que intitulei de “Pedradas” a seção do blog
que lista os comentários mais recentes dos leitores, sinalizando que eu
já bem sabia onde estava me metendo, e com quem iria lidar. Mas eis
que, depois de algum tempo, eu descobri que as pedras que os crentes
jogavam contra o meu ateísmo tiveram o curioso efeito de fortalecê-lo de
um jeito e a um ponto que eu jamais teria conseguido isolado
na minha solidão. De repente, percebi que aquelas pedras
desajeitadamente pavimentaram um caminho que acabou me conduzindo a mim
mesmo, quando me tornei a pessoa que eu sempre quis ser, mesmo quando
não sabia ao certo que queria ser assim: alguém conformado com seus
próprios defeitos, tolerante com os defeitos dos outros; ciente da
própria ignorância e vulnerabilidade; encantado com a vida, fascinado
pelo mundo, e resignado com seu próprio fim.
Mas
se fosse pra contar, eu diria que as pedradas que mais me doeram foram
justamente as que eu arremessei contra os outros, não importando aqui se
gostava deles ou não, se mereceram ou não, se acertei ou não. Também
não importando se foi ou não de caso pensado, como se diz.
Certa vez, só pra ficar num exemplo, uma moça muito querida me criticou quase que severamente por eu ter falado Charles Darwin com a pronúncia inglesa; principalmente pelo Darwin, com o w se espreguiçando em u. “É como se você quisesse se exibir”, ela disse. Mas eu não estava querendo me exibir, não, Lu. Apenas nunca tinha ouvido antes a pronúncia de sua preferência: Darvin. Além dos livros, onde o nome Darwin
vem, obviamente, apenas escrito, eu havia tomado conhecimento da Teoria
da Evolução e de seu ícone através de inúmeros vídeos no YouTube. Quase
todos eram “palestras de Natal” que Richard Dawkins ministrava — em
inglês britânico — para crianças de seu país. E eu me acostumei à
pronúncia.
Recebi
a crítica em silêncio, sem contar à Lu que nunca tive aulas sobre a
Evolução em todos os meus anos de escola pública de subúrbio do século
passado. Nem disse que ela foi a primeira pessoa que eu ouvia pronunciar Darwin com o w soando como v. Não tinha certeza se isso iria melhorar ou piorar as coisas. Então fiquei calado.
E
foi essa a primeira lição que eu aprendi com as pedras. Que a gente
pode ofender as pessoas de infinitas maneiras, ainda que nossa vontade
de não ofender ninguém também seja infinita.
Aqui
vão outras tantas pelas quais, de um jeito ou de outro, devo ter pago
um preço relativamente alto, mas que faço questão de distribuir de
graça.
‘
‘
* Enxergar nos problemas a dimensão que eles realmente têm.
*
Entender que todo problema tem uma solução. Quando se está diante de um
que não tem solução, a gente deve lembrar de não perder tempo
procurando uma, e tentar se conformar do melhor jeito que encontrar, e
seguir vivendo o melhor que puder.
* Muitas vezes, quando não conseguimos resolver um problema, o tempo se encarrega de resolvê-lo por nós.
Trate-se bem de uma gripe, e ela irá embora em sete dias; se você não se cuidar, ela pode durar toda uma semana.
* Grande parte dos nossos problemas são criados por nós mesmos.
*
Muitas das nossas frustrações advêm do fato de não nos aceitarmos como
somos e, pior ainda, por querermos fazer com que os outros nos vejam
como não somos.
* Algumas vezes, não conseguir algo que queríamos muito pode ser um golpe de sorte.
* Ser desonesto consigo mesmo é seguramente uma fonte inesgotável de sofrimento.
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