Numa sociedade que não vê o descrente com bons olhos, formulários de dados pessoais listam no campo Religião a opção Ateus. Fazendo um paralelo com o campo Automóvel, a exata correspondência teria que ser uma opção como Não sei dirigir. É como se o ‘amotorista’ tivesse que assumir para si mesmo que lhe falta algo, além do carro. Não tem seria a resposta mais precisa para indicar a relação do ateu com a religião, mas não
é a mais conveniente, porque a sociedade quer deixar claro que, como no
caso do ‘amotorista’, também lhe falta algo: a competência, a
habilidade, a capacidade intelectual para perceber Deus.
Um
equívoco que o onipresente preconceito contra ateus conseguiu
enfeitar e vender como verdade, é a declaração de que “o ateísmo também é
um tipo de crença”, onde se percebe o sofisma que pretende confundir a crença vinculada apenas à falta de conhecimento, com a crença
religiosa e com a fé. O fato de ser impossível provar que deuses são
apenas fruto da imaginação humana, que é o argumento ateísta, não
transforma um ateu num crente na inexistência de deuses, muito menos na
inexistência de um Deus específico.
Como
ninguém nunca me perguntou em quais deuses eu não acredito, ou quais
cidades eu nunca visitei, ou quais nomes não são o meu nome, eu elaborei
a minha Teoria Taxonômica Sofismática da Negativização, pelo que se
estabelece a relevância que se dá às coisas que “não são”. Por exemplo,
alguém que não sabe ler nós definimos como analfabeto, admitindo-se como
padrão a capacidade da leitura; mas não designamos como ‘amotorista’
aquele que não sabe dirigir. Isso porque existe uma intenção social
embutida na negativização dos termos. Seria vantajoso para a sociedade
se todo mundo soubesse ler? Sim. Então nomeia-se a condição negativa:
analfabeto. Seria vantajoso se todo mundo soubesse dirigir? Não!! Então
melhor esquecer o ‘amotorista’, porque palavras negativizadas sempre
mexem com os brios das pessoas, e ninguém vai querer mais gente
aprendendo a dirigir e entupindo as ruas com ainda mais carros.
Nesses
moldes tem-se o “descrente”, na sua forma mais popular “ateu”, cuja
definição é propagandeada como sendo aquele que crê na inexistência de
Deus. Só que não faz sentido acreditar na inexistência de algo, assim
como não faz sentido aprender a não ler, ou a não dirigir.
O
ateísmo é apenas uma reação à crença religiosa, do mesmo modo que a
força Normal é a reação da força Peso. Assim como a Normal, o ateísmo
não existe por si, nem faz nada além de tentar manter as coisas em
equilíbrio, evitando que o ser humano, ao desafiar a gravidade da razão,
despenque no abismo de sua própria loucura.
Direto do DEUSILUSÃO.